Tempos de jogos, tempos sem paz

Na tarde desta quarta-feira (10), no mesmo instante em que um atleta olímpico muito possivelmente levantava as mãos para o céu agradecendo a conquista de um ouro, uma família inteira, no Estado de Roraima, levava as mãos ao rosto. Nesse caso, as mãos se fechavam em ato de puro desespero. Era, naquele momento, o gesto que restaria aos parentes do soldado Hélio Andrade, atingido numa emboscada na Vila do João, na Região da Maré, no Rio de Janeiro.

Hélio, soldado da Força Nacional de Segurança, atingido na cabeça por um disparo, chegou a ser internado, mas faleceu. Hélio foi enviado ao Rio com uma missão: cuidar para que a vida dentro e fora das arenas milionárias olímpicas transcorra com sossego durante os jogos. O soldado, que pensava em comprar um carro com o dinheiro extra do trabalho realizado no Rio de Janeiro, estava aqui para garantir a celebração do ouro olímpico de tantos atletas espalhados pelas arenas milionárias.

             Charge: Fred

Mas, ao soldado da tão respeitada Força Nacional, restou a realidade carioca - que não é nem de ouro, nem de bronze ou de prata. É de chumbo mesmo. Hélio Andrade vivenciou na pele o que milhares de vítimas da violência da capital olímpica passam ano após ano, estatística após estatística.

A população do Rio e de todo o Estado sofre com a falta de segurança todos os dias, basta pôr os pés na rua. É preciso ser herói, e não apenas atleta, para aguentar tanta pressão e tanta insegurança. As Olimpíadas apenas amplificam o grito de dor da população fluminense. Afinal, é nesta hora que o mundo está nos vendo e sabendo que a nossa insegurança faz parte do nosso cardápio diário.

Entendo que a importância do esporte é inquestionável como construção cultural, como ferramenta de integração e como mecanismo de preservação da saúde. Mas, insisto, a quem interessa uma Olimpíada manchada pelas denúncias de irregularidades em obras públicas e pela violência – que segue fazendo vítimas mesmo nos dias “tão protegidos” de Jogos?

Uma cidade com as feridas da segurança pública abertas como as do Rio não pode se dar ao luxo de ter, antes de qualquer coisa, duas prioridades: Educação e Segurança Pública. Esse é o jogo que precisa ser jogado. De forma séria e eficaz e não maquiando uma realidade. Afinal, não é porque estamos em tempos de jogos, que vamos esquecer, por exemplo, que, apenas este ano, 60 policiais militares foram mortos no Rio.

Definitivamente, ao contrário do que querem os slogans bem comportados da propaganda massacrante, tempos de jogos não são tempos de paz.  Não no Rio de Janeiro. 



Marcio Garcia